quinta-feira, 11 de outubro de 2018


Resenha: A eletroestimulação em terapia intensiva: pacientes críticos.


 Pós-graduanda: Alessandra Cortez
Coordenador: Daniel Xavier 
@intensivistaxavier



No ambiente hospitalar, em especial nas unidades de terapia intensiva (UTI), estudos recentes apontam para o aumento na sobrevida dos pacientes devido ao avanço tecnológico e cientifico aplicado no tratamento da doença. O imobilismo gera um impacto negativo na terapêutica do paciente critico, pois suas complicações podem prolongar o tempo de internação, gerar maior risco de agravamento da doença de base e aumentar custos com o tratamento.

 O paciente critico é um indivíduo que necessita de monitorização continua, por instabilidade de algum dos sistemas orgânicos que implique risco à vida. Nogueira et.al, observaram 600 pacientes, que permaneceram em media nove dias na UTI, com casos que chegaram ate 79 dias de internação. As 24 horas. Tais alterações podem acometer os sistemas cardiovascular, gastrointestinal, urinário, respiratório, cutâneo e musculoesquelético.

 Pesquisam evidenciam que, em repouso completo e prolongado, o musculo perdera de 10% a 15% de força por semana e 50% entre três e cinco semanas, sendo os músculos antigravitacionais os mais atingidos. A fisioterapia sob a orientação de uma equipe multidisciplinar tem dados assistência a esses pacientes com terapias que visam reabilitar e manter os sistemas orgânicos em equilíbrio.

  A eletroestimulação neuromuscular (EENM) consiste na aplicação de uma corrente elétrica, que pode ser de baixa ou media frequência, através de eletrodos sobre a pele, com vistas a estimular um determinado musculo. Os estudos pioneiros sobre EENM tem como objeto atletas de alta performance, desde o inicio dos anos setenta, outras analises mostraram os efeitos deste recurso no aumento de força muscular, como, por exemplo, o estudo de Maffiuletti et al, que apresentaram em jogadores de voleibol de elite, aumento de força isométrica máxima e de altura do salto, após um programa  de EENM realizado por um período de quatro semanas. 

Examinando os efeitos da técnica de EENM em indivíduos saudáveis e em atletas pesquisadores interessados na área de reabilitação física, iniciaram estudos no intuito de verificar se essas técnicas poderiam ser eficientes também em indivíduos doentes. O artigo abordara detalhes referentes as maneiras pela qual foi aplicada a eletroestimulação nas populações estudadas.

  Dos cinco artigos encontrados, 3 se encaixaram nos critérios de inclusão que consistiam em visar sobre os indivíduos portadores de doenças consideradas graves e com potencial para admissão em ambiente de UTI, foram excluídos estudos que tratavam de EENM focando exclusivamente o tratamento de distúrbios musculoesqueléticos isolados.

 Os estudos em geral visavam o aumento de grau de força muscular pela EENM, que relacionavam também a força à função e ao impacto positivo na qualidade de vida do paciente. Observa-se, na Tabela 2, que o tempo de duração das terapias variou de 30 a 60 minutos, sendo o quadríceps femoral o grupo muscular mais estimulados e um em espaço intercostal nas linhas axilar e media em cada hemotórax do paciente pelos autores. Nos protocolos aplicados, houve predomínio na utilização da frequência considerada intermediaria entre 45 a 60 Hz, verificou-se que os autores concordaram em utilizar uma intensidade capaz de gerar uma contração visível no musculo alvo. Grande parte dos estudos evidenciaram aumento de força muscular, e diminuição de tempo em desmame em VMI, com uso da EENM, como visto na Tabela 1.

TABELA 1- Características dos Estudos Randomizados
Autor/ Ano
   Características
      Objetivo
   Resultados




Gruther et. al, 2010.
Pacientes em UTI estratificados em 2 grupos: precoce e tardio.
Avaliar potencia da EENM em (1) retardo da perda de massa muscular quando aplicado precocemente, e (2) reverte a atrofia muscular em pacientes a longo prazo.
A espessura da camada muscular diminuí, em ambos os grupos de EENM precoce. No grupo de EENM tardia, houve aumento de massa muscular.
Gerovasili et. al, 2010.
Pacientes em UTI, sob VMI, com APACHE II > 13.
Avaliar o efeito da EENM na preservação da massa muscular.
A EENM é bem tolerado e parece preservar a massa muscular pacientes críticos.
Melaré e Santos, 2008.
Paciente vitima de TRM cervical alto, em desmame difícil e fraqueza muscular respiratória.
Estimular o diafragma.
Após os ajustes dos parâmetros de estimulação, foi possível a retirada do suporte ventilatório e adaptação a respiração espontânea, com alta de UTI.


Routsi et. al, 2010.
Pacientes críticos, em UTI, com escore APACHE> 13.
Avaliar a eficácia da EENM na prevenção da polineuromiopatia.
Após sessões diárias de EE pode prevenir o desenvolvimento de polineuropatia em pacientes criticamente doentes e também resulta em menor tempo de desmame.
Abdellaoui A, et. al, 2011.
Pacientes em VEF1 seg.< 70%(espirometria).
Analisar se 6 semanas de EE programada pode melhorar a força muscular durante a recuperação de exacerbação aguda de DPOC.
A aplicação de um programa de EE seguinte exacerbação da DPOC é uma estratégia eficaz para contrabalançar a perda da função do musculo esquelético pela diminuição do estresse oxidativo muscular, em conjunto com as mudanças significativas na tipologia das fibras musculares.


Tabela 2- parâmetros e protocolos dos estudos randomizados.

Autor do estudo
Paciente (quantidade média e desvio padrão).
Tratamento (quantidade de intervenções e duração).
Posicionamento dos eletrodos 9 músculos estimulados).
  T (us)
  F (Hz).
T (on) em segundos.
 T off
Gruther et al, 2010.
33 pacientes/55 a 15 anos.
5 sessões de 30 a 60 min.
Quadríceps femoral.
350
  50
     8
24
Gerovasili et al, 2009.
25 pacientes/ 59 a 21 anos.
7 sessões de 55 min.
Quadríceps femoral e fibular longo.
400
  45
    12
6
Melaré e Santos, 2008.
Um paciente de 34 anos.
7 sessões de 30 a 40 min.
Estimulação diafragmática em 8° espaço intercostal da linha axilar anterior e posterior do hemitórax do paciente.
300
  -
    1
2
Rousti et al,
140 pacientes de 58 a 18 anos/ 61 a 19 anos.
Sessões de 55 min. Alta hospitalar.
Vasto lateral e medial e fibular longo.
400
  45
   1,6
6
Abdellaoui A et al, 2011.
15 pacientes 67 e 59 anos.
30 sessões de 60 min.
Isquiotibiais e quadríceps femoral.
400
35
     -
 -

 No presente estudo parte dos artigos apresentou resultados positivos sobre o ganho de força muscular ou resistência muscular. Os resultados de estudos de Gerovasilli et al., mostram que a EENM apesar de preservar a massa muscular dos pacientes, não impediu a diminuição do trofismo muscular, mesmo em menor proporção, mesmo comparando com outros estudos.

 O estudo de Rousti et al., refere que sessões diárias com EENM (55min.) estão associados com o menor tempo de ventilação mecânica, bem como a prevenção do desenvolvimento de polineuromiopatia no paciente crítico. O mesmo estudo evidencia, como limitação, que os pacientes não tiveram o grau de força avaliado durante atividades de vida diária. Gruther et al., mostrou atraso na diminuição na espessura media da camada muscular de paciente submetidos a EENM a partir de segunda semana de tempo de internação na UTI. Porem o estudo mostrou mais eficácia em pacientes tardios, em longo tempo, objetivando a reversão da hipotrofia.

 Maloré e Santos,2008, mostrou o caso de paciente com traumatismo da coluna cervical com uso de VMI prolongada e difícil desmame teve inicio o trabalho de treinamento muscular inspiratório, através de períodos de nebulização alternados com FES diafragmática,  para ganho de força muscular e endurence respiratório, na qual obteve grande sucesso, com a retirada do suporte ventilatório e adaptação a respiração espontânea e com alta da UTI. Abdellaoui et al., observaram uma diminuição na distancia percorrida na realização do teste de caminhada de 6 minutos em pacientes que realizaram a EENM após a exarcebação do DPOC.



Referências bibliográficas

·         Gerovasilis V, Stefanidis K, Vitzilaios K, et. Al. Electrical muscle stimulation preserves the muscle mass of critically ill patientes: a randomized study. Critical Care 2009; 13, 161.
·         Gruther W, Kainberger F, Fialka-Moser V, et. Al. Elffects of neuromuscular electrical stimulation on muscle layer thickness of knee extensor muscles in intensive care unit patients: a pilot study, J Rehabil Med 2010; 42, 593-597.
·         Melaré R, Santos F. Uso da eletroestimulação diafragmática no desmame ventilatório em pacientes lesados medulares. Ver Fac Ciências Medicas de Sorocaba 2008; 10.4.
·         Rousti C, Gerovasili V, Vasileiadis I, Karatzanos E, Pitsolis T, Tripodaki E, et al. Electrical muscle stimulation prevents critical illness polyneuromyopathy: arandomized parallel intervention trial. Critical Care. 2010; 14(2): R74.
·         Abdellaoui A, Prefaut C, Gouzi F, Couillard A, Coisy-Quivy M, Hugon G, et al. Skeletal muscle effects of electrostimulation after COPD exacerbation: a pilot study. Eur Respir J. 2011 Oct; 38(4):781-8.
·         Ferreira LL, Vanderlei LCM, Valenti VE. Efeitos da eletroestimulação em pacientes internados em unidade de terapia intensiva: revisão sistêmica. ASSOBRAFIR ciências.2016 (4)3:37-44.
·         Melaré RA, Santos, FF. Uso da eletroestimulação diafragmática no desmame ventilatório em pacientes lesados medulares: relato de caso. Rev. Fac. Ciências.Med.sorocaba, v.10, n.4, p. 22-24, 2008.

quarta-feira, 3 de outubro de 2018

Mobilização Precoce em Pacientes Provenientes de Complicações de SNC


MobilizaçãoPrecoce em Pacientes Provenientes de Complicações de SNC



@intensivistaxavier

O Acidente Vascular Encefálico (AVE) é uma síndrome neurológica com grande prevalência em adultos e idosos, sendo uma das principais causas de morbimortalidade no mundo. Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), o AVE é a principal causa de incapacidade no Brasil com uma incidência anual de 108 para cada 100 mil habitantes. Além disso, essa síndrome é responsável por um número considerável de internações no país, no qual apresenta um alto custo para o governo.

Diante do exposto, as complicações primárias e secundárias proveniente dos pacientes pós AVE aumentam a permanência e a restrição desses indivíduos no leito, fato esse que estando associado à ventilação mecânica e uso de sedação, potencializa o declínio funcional, o que comina em um elevado risco de morbidade e mortalidade.

Indicada para prevenir as complicações relacionadas à restrição prolongada no leito, como a fraqueza muscular adquirida na UTI (FAUTI), bem como minimizar as sequelas neurológicas oriundas da lesão primária no sistema nervoso central (SNC), a fisioterapia lança mão a mobilização precoce, atualmente bastante difundida e embasada quanto a sua seguridade e efeitos nos desfechos dos doentes criticamente enfermos, muito embora ainda não estabelecido a real dosagem a ser aplicado neste tipo em particular de pacientes.

Seguindo esta linha de raciocínio, no que diz respeito à dosagem e intensidade da mobilização precoce e o tempo para a iniciação da mesma a ser aplicada nos pacientes pós AVE, os estudos AVERT tem feitos grandes investigações a respeito desta temática e mostrado os resultados, positivos e negativos, no que tange a mobilização destes pacientes.

Relato histórico da mobilização precoce pós AVE


A mobilização precoce foi discutida pela primeira vez em um consenso na conferência sueca de tratamento do AVC em meados dos anos 80, com guidelines já existentes na Noruega e Suécia recomendando esta prática de tratamento em pacientes internados em unidades de neurointensiva.

A mobilização precoce ganhou mais notoriedade na década de 90 a partir de ensaios clínicos realizado por Indredavik e colaboradores que demonstrou que no grupo que recebeu a mobilização precoce e reabilitação houve uma redução bastante significativa na mortalidade e incapacidade comparado ao grupo de cuidados usuais de enfermagem. 

Estes estudos também serviram como base para a revisão sistemática da COCHRANE por Langhorne e colaboradores, que atestaram os efeitos benéficos da mobilização precoce em pacientes pós AVE. 

Contudo, com o intuito de aprofundar e esclarecer ainda mais os reais benefícios da mobilização precoce estão os estudos AVERT, que desde 2007 vem investigando, de forma bem criteriosa, os efeitos da MP, bem como o início e intensidade da terapia nestes pacientes em particular.

Quanto à segurança e possibilidade da MP nas primeiras 24h

O primeiro ensaio clinico randomizado, bicêntrico AVERT fase II, em 2007 em Melbourne, Austrália, buscou avaliar a seguridade e possibilidade da aplicação da mobilização precoce em adultos pós AVE dentro de 24h após admissão e estabilização dos sintomas dos pacientes na UTI comparando com cuidados usuais da enfermagem nos desfechos de mortalidade e incapacidades. Os pacientes eram visitados e avaliados aos 7 e 14 dias e aos 3, 6 e 12 meses, um bom resultado foi predefinido com um score de 0-2 na escala modificada de Ranking, acima deste score, o resultado era considerado desfavorável. Em conclusão, este estudo mostrou que a aplicação da mobilização precoce dentro de 24h é segura e possível em pacientes pós estabilização dos sintomas de AVE (que em media foi de 18.1h), com resultados favoráveis na escala de Ranking em até 12 meses, porém não houve diferença significativa entre os grupos de MP e cuidados usuais de enfermagem no desfecho de mortalidade

Quanto à eficácia e segurança da MP nas primeiras 24h

Em um clinico randomizado, controlado, multicêntrico e internacional, envolvendo cinco países (Austrália, Nova Zelândia, Malásia, Singapura e Reino Unido), o AVERT buscou investigar os efeitos e segurança da aplicação frequente da mobilização precoce de alta intensidade em adultos internados em uma UTI dentro de 24h após a estabilização dos sintomas em pacientes pós AVE comparados com os cuidados usuais de enfermagem. Como resultados primários favoráveis, predefiniu-se um score de 0-2 na escala modificada de Ranking (graduados de 0-5 e 6 quando óbito), para a avaliação da incapacidade em até 3 meses e um resultado desfavorável quando a pontuação fosse maior do que 2 ou óbito. Dentre os resultados secundários incluiu-se tempo para uma deambulação de 50m, nível de independência funcional em 3 meses e eventos adversos. 

Definiu-se como MP de alta intensidade a realização de atividades for a do leito como sentar beira-leito, ortostatismo e deambulação dentro das primeiras 24h de admissão e estabilização dos sintomas. Como resultados da aplicação deste protocolo, o grupo que realizou as atividades apresentou maiores resultados desfavoráveis na escala de Ranking, os quais apresentaram maior dependência funcional em até 3 meses pós alta da UTI. Concluiu-se, portanto, que a aplicação da mobilização precoce muito cedo e em alta intensidade impacta diretamente em um resultado desfavorável no desfecho de independência funcional em até 3 meses, permitindo, assim, uma adequação de protocolo de mobilização precoce em pacientes pós AVE.

Em um novo ensaio clinico randomizado, pragmático, prospectivo, controlado, multicêntrico e internacional, envolvendo os mesmos países, o AVERT estabeleceu a fase III de seu estudo, com o propósito de analisar os reais efeitos da frequente aplicação da MP em alta intensidade em pacientes adultos pós estabilização de sintomas de AVE dentro das primeiras 24h de internação em uma unidade de tratamento intensivo comparado com cuidados usuais de enfermagem. 

Definiu-se como protocolo de mobilização precoce: a) iniciar dentro de 24h, b) realização de atividades for a do leito (sedestação beira-leito, ortostatismo e deambulação) e c) as atividades a serem aplicadas eram conforme o nível funcional do paciente a partir de uma escala (Tabela 1).

O objetivo deste trabalho foi o de avaliar a eficácia da MP através de protocolos de atividades, abordando os desfechos de mortalidade e incapacidade em até 3 meses avaliados pela escala modificada de Ranking, avaliar a redução de números e gravidades das complicações pós AVE, se melhorou a qualidade de vida em até 12 meses e o custo-beneficio da mobilização precoce. 

Conclusão, os pacientes do grupo da aplicação do protocolo de MP em alta intensidade obtiveram um resultado desfavorável no desfecho de independência funcional em até 3 meses, a qualidade de vida avaliada aos 12 meses foi semelhantes entre os grupos, contudo uma mobilização mais em dosagens mais baixas pode ser o fator chave para um desfecho mais favorável.
Tabela 1 Escala de nível funcional


Conclusão

Os AVERT são os maiores e mais abrangentes estudos controlados e randomizados já realizado e levantam inúmeras questões a respeito da mobilização muito precoce (dentro de 24h) em pacientes pós AVE, em particular quais são as reais condições fisiológicas e quais as alterações moleculares que são induzidas pós AVE podem ser prejudiciais em alguns pacientes alvos da terapia. Portanto, não se trata apenas da recomendação ou não da mobilização precoce, pois desta forma se torna muito banal e praticamente anulam tais resultados já levantados.


Próximo estudo AVERT

AVERT Dose-frequência da mobilização muito precoce (dentro de 24h) após estabilização dos sintomas de AVE em pacientes admitidos em uma unidade de tratamento intensivo, com o objetivo de determinar a dosagem ótima da aplicação da MP.



Referências

Bernhardt J, Dewey H, Thrift A, Collier J, Donnan G. A Very Early Rehabilitation Trial for Stroke (AVERT): Phase II Safety and Feasibility. Stroke, 39(2), 390–396. 2008.

Bernhardt J, English C, Johnson L, Cumming TB. Early Mobilization After Stroke: Early Adoption but Limited Evidence. Stroke, 46(4), 1141–1146. 2015.

Langhorne P, Stott D, Knight A, Bernhardt J, Barer D, Watkins C. Very Early Rehabilitation or Intensive Telemetry after Stroke: A Pilot Randomised Trial. Cerebrovascular Diseases, 29(4), 352–360. 2010.

Botelho TS, Neto CDM, Araújo FLC, Assis SC. Epidemiologia do acidente vascular cerebral no Brasil. Temas de saúde.  Volume 16, Número 2 ISSN 2447-2131 João Pessoa, 2016

Langhorne P, Wu O, Rodgers H, Ashburn A, Bernhardt J. A Very Early Rehabilitation Trial after stroke (AVERT): a Phase III, multicentre, randomised controlled trial. Health Technol Assess 2017;21(54).

quinta-feira, 14 de junho de 2018

Protocolo de atendimento progressivo em pacientes neurocirúrgicos em Terapia Intensiva

Autores: Laseane da Silva Mota*; Vitor lima de Azevedo*
*Pós-graduando(a) em Fisioterapia Intensiva pelo Instituto de aprimoramento em Ensino Superior (IAPES).

Coordenador: Daniel Xavier
Embora a sobrevida de pacientes críticos tenha aumentado nos últimos anos, complicações decorrentes da imobilidade na unidade de terapia intensiva contribuem para o declínio funcional, aumento dos custos assistenciais, redução da qualidade de vida e sobrevida pós-alta. A intervenção fisioterapêutica precoce se faz necessária para prevenir problemas físicos e psíquicos, evitando a internação prolongada e os riscos associados à imobilização. O benefício terapêutico da mobilização precoce vem se comprovando real, a fim de evitar deficiências e abreviar a alta hospitalar. Diversos estudos surgem nos últimos anos com o objetivo de proporcionar eficácia no atendimento ao paciente crítico, assistindo na tomada de decisões e promovendo a recuperação e/ou preservação da funcionalidade, através do movimento humano e suas variáveis.
Cuidados na abordagem do paciente neurológico grave são imprescindíveis e requerem conhecimentos específicos como fisiologia da pressão intracraniana, circulação sanguínea e metabolismo cerebral, além do entendimento das complicações advindas da lesão cerebral. Com objetivo de aperfeiçoar o atendimento do paciente neurológico crítico, foram reunido diversas abordagens fisioterapêuticas baseadas em evidências relevantes e recentes; e formulado um protocolo de abordagem progressiva neurofuncional em unidade de terapia intensiva, que poderá auxiliar em uma abordagem segura, eficiente e confiável.

A começar, avaliou-se a aplicabilidade de mobilização precoce no paciente neurofuncional crítico. Pires-Neto (2013) avaliou os efeitos de exercícios com cicloergômetro por 20 minutos em 19 pacientes profundamente sedados, nas primeiras 72horas de ventilação mecânica, avaliando minuto a minuto o débito cardíaco, resistência vascular sistêmica, saturação de oxigênio, frequência respiratória, volume corrente, consumo de oxigênio, produção de dióxido de carbono e níveis de lactato sanguíneo. O exercício passivo com cigloergômetro foi considerado seguro e não foi associado a alterações significativas na hemodinâmica, respiratória ou variáveis ​​metabólicas mesmo em aqueles que exigem agentes vasoativos.

Roth (2013) realizou um estudo com 84 pacientes, divididos em dois grupos: Pacientes com média de PIC <15 1="" e="" mmhg="" rupo="" span=""> pacientes com PIC >15 mmHg (Grupo 2), tratados com amplitude passiva de movimento e avaliando alterações na (PIC) e pressão de perfusão cerebral (PPC). Não foram observados efeitos colaterais nos dois grupos, utilizando mobilização passiva, concluindo que mobilizações passivas podem ser utilizadas com segurança em pacientes com doenças neurológicas agudas, mesmo quando a PIC é elevada.

Intervir de forma precoce também é fundamental para a melhora da função respiratória e melhora da aptidão cardiovascular. Thiesen (2005) verificou a influência da fisioterapia respiratória na pressão intracraniana em pacientes com traumatismo cranioencefálico, avaliando dados de 35 pacientes com TCE grave (ECG 8 e PIC <30mmhg a="" como:="" de="" diversas="" fisioterapia="" manobras="" respirat="" ria="" span="" style="mso-spacerun: yes;" submetidos=""> pressão manual expiratória com vibração manual costal , pressão manual expiratória com vibração manual diafragmática, drenagem postural, pressão manual expiratória com descompressão, pressão manual expiratória com descompressão diafragmática e aspiração endotraqueal. Observou-se aumento significativo de PIC após manobra de aspiração traqueal, com normalização 1 minuto e 30 minutos depois . Essas mudanças não foram acompanhadas de aumentos de PAM e a PPC manteve-se dentro do limite da normalidade. As manobras respiratórias avaliadas não afetaram de modo clinicamente significativo a PPC em pacientes com TCE grave, com valores da PIC até 30 mmHg, indicando segurança nesses tipos de intervenções em pacientes portadores de TCE grave, com PIC menor que 30 mmHg.
O desenvolvimento de fraqueza generalizada relacionada ao paciente crítico é uma complicação recorrente em pacientes admitidos em uma unidade de terapia intensiva. A redução da força muscular aumenta o tempo de desmame, de internação, o risco de infecções e consequentemente morbimortalidade. A fisioterapia é usada nesses pacientes como recurso para prevenção da fraqueza muscular, hipotrofia e recuperação da capacidade funcional (SILVA, 2010). Como objetivo de avaliar o efeito de uma intervenção em mobilidade baseada em Pacientes com AVC hemorrágicos em unidade de tratamento neurointensivo, realizando atividades como sedestação beira leito e deambulação progressiva, Rand (2015) sugere em suas conclusões que um modelo prognóstico preciso para a mobilidade em pacientes com acidente vascular cerebral hemorrágico poderia levar a uma maior probabilidade de obtenção de resultados funcionais favoráveis na marcha e qualidade de vida pós alta.

Baseado nos estudos acima relatados e em outros estudos relevantes pesquisados, montou-se uma proposta de protocolo de intervenção progressiva neurofuncional do paciente crítico, com o objetivo de aumentar a eficácia da abordagem fisioterapêutica no paciente neurológico internado em unindade de terapia intensiva mantendo um margem de segurança no manejo deste paciente.

Referencias Bibliográficas

FELICIANO, Valéria et al. A influência da mobilização precoce no tempo de internamento na Unidade de Terapia Intensiva. Assobrafir Ciência, v. 3, n. 2, p. 31-42, 2012.
FRANÇA, Eduardo Ériko Tenório de et al. Fisioterapia em pacientes críticos adultos: recomendações do Departamento de Fisioterapia da Associação de Medicina Intensiva Brasileira. Revista Brasileira de Terapia Intensiva, v. 24, n. 1, p. 6-22, 2010.
PIRES-NETO, Ruy Camargo et al. Very early passive cycling exercise in mechanically ventilated critically ill patients: physiological and safety aspects-a case series. PLoS One, v. 8, n. 9, p. e74182, 2013.
RAND, Maxine L.; DARBINIAN, Jeanne A. Effect of an evidence-based mobility intervention on the level of function in acute intracerebral and subarachnoid hemorrhagic stroke patients on a neurointensive care unit. Archives of physical medicine and rehabilitation, v. 96, n. 7, p. 1191-1199, 2015.
ROTH, Christian et al. Effect of early physiotherapy on intracranial pressure and cerebral perfusion pressure. Neurocritical care, v. 18, n. 1, p. 33-38, 2013.
SILVA, Ana Paula Pereira da; MAYNARD, Kenia; CRUZ, Mônica Rodrigues da. Efeitos da fisioterapia motora em pacientes críticos: revisão de literatura. Revista Brasileira de Terapia Intensiva, v. 22, n. 1, p. 85-91, 2010.
THIESEN, Rosana A. et al. Influência da fisioterapia respiratória na pressão intracraniana em pacientes com traumatismo craniencefálico grave. Arquivos de Neuro-Psiquiatria, 2005.

terça-feira, 5 de junho de 2018

Atuação Fisioterapêutica na Unidade de Terapia Intensiva Oncológica Com Foco no Pós-Operatório de Câncer de Cabeça e Pescoço (CCP)


Atuação Fisioterapêutica na Unidade de Terapia Intensiva Oncológica Com Foco no Pós-Operatório de Câncer de Cabeça e Pescoço (CCP)


KENNYS W. BARRETO DE MATOS
MOACIR CARRION
Coordenador: Daniel Xavier


1.                  INTRODUÇÃO


No contexto atual, com os diversos avanços na pesquisa cientifica e no tratamento de pacientes oncológicos, cresce há maior probabilidade de recuperação e cura da doença bem como de seus efeitos deletérios na unidade de terapia intensiva (UTI).
Uma UTI oncológica apresenta rotina semelhante à de outras UTI, entretanto segue um modelo específico de condutas e atribuições que se estendem desde a condução dos pacientes ao tipo de abordagem oncológica.

O fisioterapeuta na mais ampla condição de intervencionista tem o papel minucioso de identificar as disfunções apresentadas pelo paciente, agindo de forma preventiva ou terapêutica de modo eficaz. Considerando a potencial perda de função física comum a pacientes internados na UTI sendo intensificadas pela condição patológica apresentada é considerado uma abordagem fisioterapêutica precoce para prevenir a síndrome do imobilismo e consequências atribuídas que possam gerar cada vez mais perda de função com respostas negativas no contexto saúde e vida.   
  
Cada vez mais, novos casos de câncer de cabeça e pescoço (CCP) são inclusos nas estatísticas de mortalidade no mundo, o diagnóstico muitas vezes é preciso e auxilia no processo de intervenção precoce. Os fatores de risco pertinentes ao CCP são o etilismo, tabagismo, trauma crônico, má higiene oral, gengivite crônica imunodeficiência, infecções e presença de tumor primário do trato aéreo-digestivo.

Lesões envolvendo a região de cabeça e pescoço principalmente em pacientes internadas na UTI que passaram por processo cirúrgico, geralmente apresentam agravantes significativos resultando em imobilidade do plexo braquial, rigidez muscular, zonas de alta tensão, dor cervical e adjacentes, comprometimentos do padrão respiratório por receio de dor e controle da ação muscular, além da restrição de movimentos com perda de força e progressão com complicações respiratórias e cardiopulmonares.

Contudo cabe ao fisioterapeuta diante das características patológicas encontradas, atuar de forma efetiva, minimizando os efeitos deletérios da doença. Assim são criados protocolos de tratamento padronizado a serem realizados no pós-operatório de CCP com a condição de respeito à especificidade apresentada.  O objetivo é preserva a forma e função do órgão garantindo melhora na sobrevida do paciente.

2.                  FISIOTERAPIA NO CÂNCER DE CABEÇA E PESCOÇO (CCP)

O primeiro contato com o paciente deve ser o quanto precoce e iniciado ainda no pré-operatório através de avaliações minuciosa objetivando detectar futuras complicações indesejáveis no pós-operatório. Deve ocorrer: avaliação da função pulmonar através de prova de função ventilatória e/ou avaliação subjetiva respiratória bem detalhada pois o câncer nesta região tem forte relação com o consumo de tabaco, sendo evidentes complicações mais frequentes nos pacientes cirúrgicos de cabeça e pescoço infecções pulmonares e atelectasias. A avaliação motora que também ocorrerá no pós-cirúrgico vem em seguida buscando identificar alterações cinético funcionais pré-existentes bem como possíveis fatores de risco para o pós-operatório.

No pós-operatório segue os procedimentos ligados a propedêutica fisioterapeuta na UTI, com avaliação da condição respiratória, física funcional e neurológica. O uso de escalas e protocolos normatizados também são de suma importância desde que se encaixem a especificidade do paciente.

A conduta é sempre voltada para as principais limitações do paciente. As complicações respiratórias agravantes com atelectasias devem ser tradas através da ventilação protetora e ajustes no ventilador mecânico (VM), somada a mobilização precoce para evitar trombose venosa profunda e já minimizar os da síndrome do imobilismo. Os exercícios respiratórios garantem evolução positiva minimizando as alterações induzidas pela anestesia como diminuição da CRF, baixo VC e fluxo respiratória. A manutenção das vias aéreas pérvias bem como o posicionamento leito vão garantir a estabilidade da paciente.

3.                  PROTOCOLO FISIOTERAPÊUTICO NO PÓS-OPERATÓRIO DE CABEÇA E PESCOÇO – ABORDAGEM NA UTI

·      População – alvo

Pacientes submetidos a procedimentos cirúrgicos de cabeça e pescoço em específico para retirada de neoplasias. O qual se encaixam os cânceres de seios para nasais, câncer de cavidade oral, câncer de glândulas salivares, câncer de nasofaringe, câncer de orofaringe, câncer de laringe e tumores cerebrais.
·      Indicação   

Prevenção de complicações, tratamento de sintomatologias e propensão a alta hospitalar o mais rápido possível.
·      Contraindicações/cuidados

No PO imediato evitar movimentação de cervical com amplitudes completas, respeitar o limite de dor, o grau de restrição e dosagem da manipulação (o excesso de manipulação por um único momento resulta em aumento dos efeitos deletérios e do índice de mortalidade).
Cuidados com os drenos, acessos e o ponto cirúrgico, evitando uma retirada indesejada ou trauma durante um movimento brusco.

·      Avaliação      

Anamnese, exames complementares, avaliação neurológica e complementações como: sinais vitais e ausculta pulmonar. Por seguinte o exame físico: grau de rigidez dos músculos do plexo braquial, escala de dor, amplitude de movimento, palpação e presença de aderências. Ainda na avaliação observar comprometimento neurológio com consequente plegia ou paresia, além de paralisia facial (par de nervo craniano afetado e tipologia central ou periférica).
É indispensável o uso das escalas de Glasgow (nível de consciência) e escala de Ramsay (sedação).  




·      Conduta Indicadas


Step 1: Corresponde ao pós-operatório imediato, assim que o paciente chega a Unidade de Tratamento Intensiva (UTI).

(Pacientes sob VMI geralmente encontram-se neste estado por conta resposta negativas a anestesia, infecções respiratórias e atelectasias).
o   Ajustar a VM de forma protetora e não lesiva seguindo as características clínicas do paciente e baseando-se nos exames complementares (Gasometria, exames de imagem e condição cardiorrespiratória);  
o   Progredir para interrupção da ventilação mecânica;
o   Garantir oxigênio (O2) suplementar.

Step 2: Corresponde ao pós-operatório imediato a partir das 2 horas após a extubação, se o paciente estiver evoluindo bem do estado geral (BEG).
o   Garantir o O2 suplementar para suprir a demanda e o déficit ventilatório.
o   Uso da VNI nestes casos.
(Indicada no pós-operatório imediato estando associada à melhora da troca gasosa, redução de atelectasias e diminuição do trabalho respiratório; Uso da VNI para evitar IRpA mantendo-se pressões inspiratórias mais baixas (EPAP < 8 e IPAP < 15; e evitar risco de intubação).
(CPAP -  aumento da PIC)
(Contraindicações relativas: cirurgia facial ou neurológica, traumas faciais e deformidades; analisar caso a caso risco x benefício).
o   Posicionar o paciente em decúbito dorsal (DD) com a cabeceira em Fowler (60º);
o   Realizar drenagem autógena (inspiração e expiração lentas e profundas que se iniciam do volume de reserva expiratório e finalizam no volume de reserva inspiratório) seguida de Huffing (5 repetições);
o   Realizar a cinesioterapia respiratório (3 séries de 10 repetições de cada repetição de exercício); Reeducação diafragmática; Padrão ventilatório (VP) 3:1 associado a elevação de membros superiores;
o   Realizar cinesioterapia motora (mobilização passiva com movimento em diagonais leves de MMII e plexo braquial – 10 repetições).

Step 3: Corresponde seis horas após a extubação, se o paciente estiver evoluindo bem (BEG).

o   Retirar suplementação de O2 se possível;
o   Posicionar o paciente sentado fora do leito;
o   Realizar drenagem autógena (5 repetições);
o   Realizar a cinesioterapia respiratório (3 séries de 10 repetições de cada repetição de exercício); Reeducação diafragmática; Padrão ventilatório (VP) 3:1 associado a elevação de membros superiores limitados a 90º;
o   Deambular no quarto;
o   Paciente em sedestação na poltrona por mais de 1 hora.

Step 4: Corresponde ao 1º, 2° e 3° dias após cirurgia, se BEG.

o   Realizar drenagem autógena;
o   Realizar cinesioterapia respiratória;
o   Deambular no corredor progredindo a distância percorrida a cada sessão;
o   Liberação miofascial da porção superior do trapézio + mobilização passiva suave de cervical.


 Step 5: Corresponde ao 4º dia após a cirurgia, se BEG, até a previsão de alta.

o   Realizar cinesioterapia respiratória;
o   Deambular no corredor progredindo a distância percorrida a cada sessão.;
o   Permitir a sedestação em poltrona com variação para ortostatismo com apoio de MMSS e retorno a posição permanecendo por mais de 2 horas.
o   Orientação quantos aos cuidados paliativos.
  







































 4.    CONCLUSÃO

A atuação fisioterapêutica em pacientes na Unidades de Terapia Intensiva minimiza a perda das habilidades funcionais, com resultados favoráveis para a prevenção e o tratamento de desordens neuromusculares decorren­tes da maior sobrevida dos pacientes e permanência pro­longada no leito, como demonstrado por diversos estudos. Recentes estudos têm confirmado que a mobili­zação em pacientes ventilados mecanicamente é um procedi­mento seguro e viável, diminuindo o tempo de internação na UTI e hospitalar. O ponto a configurar a máxima condição do paciente é o desfecho final, com saída da UTI com o mínimo de efeitos lesivos e boa prospectiva de vida.

5.    REFERÊNCIAS

BORGES, V. M; OLIVEIRA, R. C; CARVALHO, N. A. A. Motor physiotherapy in intensive care adult patients. Rev Bras Ter Intensiva. 2009; 21(4):446-452.

MASTRELLA, A. et. I Consenso de Fisioterapia em Cancerologia. Sociedade Brasileira de Fisioterapia em Cancerologia, Apoio: Ministério da Saúde. 2006.
SILVA, A. S; PINTO, J. G; MARTINEZ, B. P; CAMELIER, F. W. R. Mobilização na Unidade de Terapia Intensiva: revisão sistemática. Rev. Fisioter Pesq. 2014; 21(4):398-404.

BARBAS, C. S. V. et. Diretrizes Brasileiras de Ventilação Mecânica. I fórum de diretrizes em ventilação mecânica. 2013.

PINTO, R. F. et. al. Rev. Bras. Cir. Cabeça Pescoço, v.43, nº 4, Outubro / Novembro / Dezembro 2014.

SOUZA, I. F; DIAS, A. N. M; FONTES, F. P; MELO, L. P. Physical Therapy Methods Used in the Treatment of Peripheral Facial Paralysis: A Review. Revista Brasileira de Ciências da Saúde Volume 19 Número 4 Páginas 315-320 (2015) ISSN 1415-2177.


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