quinta-feira, 14 de setembro de 2017

Carcinogênese ou Oncogênese

INSTITUTO AMAZONENSE DE APRIMORAMENTO E ENSINO EM SAÚDE - IAPES
PÓS-GRADUAÇÃO EM FISIOTERAPIA INTENSIVA ADULTO, PEDIATRICO E NEONATAL

Sabrina Iwata Pinheiro
Coordenador: Daniel Xavier

Carcinogênese ou Oncogênese


     
A palavra carcinogênese é derivada do grego, língua na qual karkinos significa câncer e genesis significa produção ou origem, e foi utilizada pela primeira vez por Hipócrates, o pai da medicina, que viveu entre 460 e 377 a.C.  O câncer não é uma doença nova. O fato de ter sido detectado em múmias egípcias comprova que ele já comprometia o homem há mais de 3 mil anos antes de Cristo.  Atualmente, câncer é o nome geral dado a um conjunto de mais de 100 doenças, que têm em comum o crescimento desordenado de células, que tendem a invadir tecidos e órgãos vizinhos.

       O processo de formação do câncer é chamado de carcinogênese ou oncogênese e, em geral, acontece lentamente, podendo levar vários anos para que uma célula cancerosa se prolifere e dê origem a um tumor visível. Os efeitos cumulativos de diferentes agentes cancerígenos ou carcinógenos (químicos, físicos ou biológicos) são os responsáveis pelo início, promoção, progressão e inibição do tumor. A carcinogênese é determinada pela exposição a esses agentes, em uma dada frequência e período de tempo, e pela interação entre eles. Devem ser consideradas, no entanto, as características individuais, que facilitam ou dificultam a instalação do dano celular. Inicia-se com a exposição de células do organismo a agentes carcinógenos. 

       Dois tipos de genes controlam o crescimento celular normal e a replicação: genes reguladores promotores de crescimento chamados proto-oncogenes, e genes reguladores inibidores de crescimento chamados antioncogenes. Estes genes são implicados como os principais alvos dos danos genéticos que ocorrem durante o desenvolvimento de uma célula cancerosa.  Tal dano pode ser obtido pela ação de substâncias químicas, radiação ou vírus, ou ser herdado da linhagem germinativa. A maioria dos cânceres são de origem multifatorial, agindo vários fatores em conjunto ou sequencialmente, para produzir as várias anomalias que são características das células cancerosas. A proliferação tumoral é lenta e ocorre em etapas.   

       Esse processo é composto por três estágios: 

• Estágio de iniciação: É o primeiro estágio da carcinogênese, onde as células sofrem o efeito causado pelos agentes cancerígenos (físicos, químicos ou biológicos) que provocam mutações em alguns genes. Nesta etapa as células se tornam geneticamente alteradas, mas clinicamente não é possível se detectar um tumor.

•Estágio de promoção: É o segundo estágio da carcinogênese, onde as células mutadas sofrem os efeitos dos agentes cancerígenos denominados oncopromotores. Essas células se transformam em malignas, de forma lenta e gradual. Mas, para que isso ocorra, é necessário o contato contínuo com o agente cancerígeno oncopromotor. No caso desse contato deixar de acontecer, muitas vezes o processo é interrompido neste estágio.

  •Estágio de progressão: É o terceiro e último estágio da carcinogênese, no qual ocorre a multiplicação descontrolada das células alteradas. Nesta etapa, a multiplicação é irreversível e se estende até as primeiras manifestações clinicas da doença. Essa expansão clonal modifica também os tecidos adjacentes às células modificadas. A progressão representa a etapa em que as células malignas apresentam o fenótipo característico, desenvolvem maior agressividade, crescimento rápido e potencial de invasão e disseminação.
          
      O período de latência varia com a intensidade do estímulo carcinogênico, com a presença ou ausência dos agentes oncoiniciadores, oncopromotores e oncoaceleradores, e com o tipo e localização primária do câncer.

      Os agentes cancerígenos são de três tipos:

Agente oncoiniciador: Provoca o dano em células, diretamente. É o agente iniciador do câncer. Um exemplo é o benzopireno, um dos componentes da fumaça do cigarro.

Agente oncopromotor: Transforma células iniciadas em malignas.

Agente oncoacelerador: Multiplica descontroladamente células já iniciadas. Participa do estágio final do processo. 

     As células que constituem os animais são formadas por três partes: a membrana celular, que é a parte mais externa da célula; o citoplasma, que constitui o corpo da célula; e o núcleo, que contém os cromossomos que por sua vez são compostos de genes. Os genes são arquivos que guardam e fornecem instruções para a organização das estruturas, formas e atividades das células no organismo. Toda a informação genética encontra-se inscrita nos genes, numa "memória química" - o ácido desoxirribonucleico (DNA). É através do DNA que os cromossomos passam as informações para o funcionamento da célula. 

     Uma célula normal pode sofrer alterações no DNA dos genes. É o que chamamos mutação genética. As células cujo material genético foi alterado passam a receber instruções erradas para as suas atividades. As alterações podem ocorrer em genes especiais, denominados protooncogenes, que a princípio são inativos em células normais. Quando ativados, os protooncogenes transformam-se em oncogenes, responsáveis pela malignização (cancerização) das células normais. Essas células diferentes são denominadas cancerosas. 

      As células alteradas passam então a se comportar de forma anormal. 

     Multiplicam-se de maneira descontrolada, mais rapidamente do que as células normais do tecido à sua volta, invadindo-o. Geralmente, têm capacidade para formar novos vasos sanguíneos que as nutrirão e manterão as atividades de crescimento descontrolado. O acúmulo dessas células forma os tumores malignos. 

     Adquirem a capacidade de se desprender do tumor e de migrar. Invadem inicialmente os tecidos vizinhos, podendo chegar ao interior de um vaso sanguíneo ou linfático e, através desses, disseminar-se, chegando a órgãos distantes do local onde o tumor se iniciou, formando as metástases. Dependendo do tipo da célula do tumor, alguns dão metástases mais rápido e mais precocemente, outros o fazem bem lentamente ou até não o fazem. 

     As células cancerosas são, geralmente, menos especializadas nas suas funções do que as suas correspondentes normais. Conforme as células cancerosas vão substituindo as normais, os tecidos invadidos vão perdendo suas funções. Por exemplo, a invasão dos pulmões gera alterações respiratórias, a invasão do cérebro pode gerar dores de cabeça, convulsões, alterações da consciência etc.
     A denominação dos tumores deriva dos tecidos que os originam. Os principais tipos de tumores são os carcinomas (tecido epitelial), sarcomas (tecido conjuntivo), linfomas (tecido linfático), gliomas (células gliais do sistema nervoso central) e leucemias (hematopoiéticos).
Fatores de risco modificáveis:

    Diversos fatores de risco classificados como modificáveis já foram identificados, como: uso de tabaco e álcool, hábitos alimentares inadequados, inatividade física, agentes infecciosos, radiação ultravioleta, exposições ocupacionais, poluição ambiental, radiação ionizante, alimentos contaminados, obesidade e situação socioeconômica. Há ainda nessa relação o uso de drogas hormonais, fatores reprodutivos e imunossupressão. Essa exposição é cumulativa no tempo e, portanto, o risco de câncer aumenta com a idade. Mas é a interação entre os fatores modificáveis e os não modificáveis que vai determinar o risco individual de câncer

      Uso de tabaco: É a principal causa dos cânceres de pulmão, laringe, cavidade oral e esôfago; tem um importante papel nos cânceres de bexiga, leucemia mieloide, pâncreas, colo do útero e outros.

      Alimentação inadequada: Uma alimentação rica em gordura saturada e pobre em frutas, legumes e verduras aumenta o risco dos cânceres de mama, cólon, próstata e esôfago.  Uma alimentação rica em alimentos de alta densidade energética aumenta o risco de ganho de peso de desenvolvimento da obesidade, que é um fator de risco para diversos tipos de câncer. Lembrando que alimentos de alta densidade energética concentram muitas calorias em um pequeno volume. Consumir frutas, legumes e verduras diminui o risco de cânceres de pulmão, pâncreas, cólon e reto, próstata, esôfago, boca, faringe e laringe.  Por outro lado, a contaminação de alimentos pode ocorrer naturalmente, como no caso das aflatoxinas (câncer de fígado). 

        Inatividade física: A prática regular de atividade física diminui o risco de câncer de cólon e reto, de mama (na pós-menopausa) e de endométrio; além disso, reduz o risco de desenvolver obesidade (fator de risco para diversos tipos de câncer). 

        Obesidade: É um fator de risco importante para os cânceres de endométrio, rim, vesícula biliar e mama.

        Consumo excessivo de bebidas alcoólicas: O uso excessivo de bebidas alcoólicas pode causar cânceres de boca, faringe, laringe, esôfago, fígado, mama e cólon e reto. O risco de desenvolver câncer de cavidade oral é aumentado quando há associação ao fumo.

       Agentes infecciosos: Eles respondem por 18% dos cânceres no mundo. O HPV, o vírus da hepatite B e a bactéria Helicobacter Pylori respondem pela maioria dos cânceres associados a infecções. 

       Radiação ultravioleta / ionizante 

       Ultravioleta: a luz do sol é a maior fonte de raios ultravioleta, causadores do câncer de pele.

         Ionizante: a mais importante radiação ionizante é proveniente dos Raios X, mas ela também pode ocorrer na natureza em pequenas quantidades.

         Exposições ocupacionais: Substâncias encontradas no ambiente de trabalho, tais como: asbesto, arsênio, benzeno, sílica, radiação, agrotóxico, poeira de madeira e de couro e fumaça do tabaco são carcinogênicas. O câncer ocupacional mais comum é o de pulmão, devido ao tabagismo passivo.
        Poluição ambiental: A poluição da água, do ar e do solo responde por 1% a 4% dos cânceres em países desenvolvidos. A poluição tabagística ambiental é a principal poluição em ambientes fechados, segundo a OMS, sendo classificada como tabagismo passivo. 

       Nível socioeconômico: A associação do nível socioeconômico com vários tipos de cânceres provavelmente se refere ao seu papel como marcador do modo de vida e de exposição das pessoas a outros fatores de risco do câncer.

       Comportamento sexual: Iniciar precocemente as atividades sexuais, possuir parceiro sexual com múltiplas parceiras e possuir múltiplos parceiros sexuais são fatores relacionados ao desenvolvimento de infecção pelo HPV, que é o principal fator de risco para o desenvolvimento do câncer do colo do útero.

Fatores de risco não modificáveis

     Nesse grupo, estão relacionados os fatores de risco que não dependem do comportamento, hábitos e práticas individuais ou coletivas. Também são conhecidos como fatores de risco intrínsecos. São eles: idade, gênero, etnia/raça e herança genética ou hereditariedade.  São raros os casos de cânceres que se devem exclusivamente a fatores hereditários, familiares ou étnicos, apesar de o fator genético exercer um importante papel na oncogênese. Um exemplo são os indivíduos com retinoblastoma (tumor ocular) que, em 10% dos casos, apresentam história familiar desse tumor. 

      Alguns tipos de câncer de mama, estômago e intestino parecem ter um forte componente familiar, embora não se possa afastar a hipótese de exposição dos membros da família a uma causa comum. Determinados grupos étnicos parecem estar protegidos de certos tipos de câncer: a leucemia linfocítica é rara em orientais, o Sarcoma de Ewing (uma forma de tumor ósseo) é muito raro em negros.

      Idade: O risco da maioria dos cânceres aumenta com a idade e, por esse motivo, eles ocorrem mais frequentemente no grupo de pessoas com idade avançada.

      Etnia ou raça: Os riscos de câncer variam entre grupos humanos de diferentes raças ou etnias. Algumas dessas diferenças podem refletir características genéticas específicas, enquanto outras podem estar relacionadas a estilos de vida e exposições ambientais.

     Hereditariedade: Os genes de cânceres hereditários respondem por 4% de todos os cânceres. Alguns genes afetam a susceptibilidade aos fatores de risco para o câncer. 

     Gênero: Certos cânceres que ocorrem em apenas um sexo são devido a diferenças anatômicas, como próstata e colo do útero; enquanto outros ocorrem em ambos os sexos, mas com taxas marcadamente diferentes entre um sexo e outro, como o câncer da bexiga (muito mais frequente no homem que na mulher) e o da mama (mais frequente na mulher que no homem).

Considerações Finais

      Os principais fatores de risco para o desenvolvimento do câncer são vírus, radiações e substâncias químicas. 
       A variabilidade genética que existe entre os indivíduos nas enzimas de reparo de DNA, no controle da vigilância imunológica e na capacidade metabólica de transformar determinadas substâncias em agentes carcinogênicos, são fatores que explicam porque somente algumas pessoas desenvolvem as neoplasias.
     Alguns fatores podem diminuir os riscos de desenvolver o câncer como: ingestão freqüente de fibras e vegetais crucífeos (brócolis, couve-flor, espinafre etc.), não fumar, não ingerir álcool ou fazê-lo com moderação, fazer exercícios regularmente, não se tornar sobrepesado ou obeso, limitar a ingestão de lipídios e exposição ao sol, e principalmente reconhecer os sintomas e sinais do câncer com antecedência.
     Existem também sinais que devem ser levados em consideração, pois servem e alerta sobre a presença de um tumor: mudanças de hábitos fisiológicos intestinais e renais, hemorragias ou sangramentos inusual, indigestão persistente, dificuldade para engolir, dificuldade de cicatrização, presença de edema o nódulo, tosse ou rouquidão crônica e alteração na aparência de um sinal ou de uma verruga.
      Atualmente laboratórios vêm desenvolvendo drogas e produtos biológicos que combatem as células tumorais. Os inibidores de angiogênese, drogas que impedem a formação de novos vasos sanguíneos, evitando que os tumores recebam oxigênio e nutrientes através do sangue. Um outro tipo de produto são os anticorpos carregados de drogas, que ao serem injetados nos pacientes dirigem-se para os tumores e ligam-se apenas as células cancerosas. Estão sendo desenvolvidas imunoterapias, ou vacinas, que tem a finalidade de avisarem o sistema imunológico do paciente da presença de um tumor, levando à ativação de células, como os linfócitos citotóxicos, que são capazes de atacar e elimina as células tumorais.
      Anteriormente acreditava-se que o aparecimento de um tumor não acionava o sistema imune por duas razões: a produção pelo próprio tumor de substâncias inibidoras de células imunológicas e a falta de visibilidade do tumor para o sistema imunológico, que ano detectaria o problema porque as células não apresentariam antígenos. Hoje, sabe-se que as células tumorais têm antígenos e que estes podem ser usados para a produção de vacinas.
       A célula dendrítica (DC) vem desempenhando o importante papel de ‘transportador’ e um ‘apresentador’ eficiente para as moléculas imunizantes. 
      As DCs tem a capacidade de ‘triturar’ e ‘comer’ células cancerosas, ou microrganismos invasores, e migrar para os órgãos do sistema imune, para avisar outras células de defesa. Isso ocorre porque os fragmentos que ficam no interior e depois na superfície das células dendríticas tornam-se potentes antígenos, capazes de acionar outras células do sistema imune para que destruam tumores e microrganismos invasores.
     Após serem vacinados com as DCs, pacientes apresentaram algumas respostas imunológicas específicas contra o tumor, como a hipersensibilidade tardia e a ativação de linfócitos citotóxicos em testes laboratoriais.

Referências Bibliográficas

ABBAS, A. K. et al. Cellular and molecular immunology.  2nd. Philadelphia: W. B. Saunders Co., 1994. p. 356-375.
COTRAN, RAMZI.; KUMAR,VINAY.; COLLINS, TUCKER. Patologia estrutural e funcional. Ed. Guanabara koogan, 6º edição.
DEVITA Jr, Vincent T.; Hellman, Samuel; Rosenberg, Steven A. Cancer: principles and practice of oncology. 7. ed. Philadelphia: Lippincott Williams & Wilkins, 2005. 3120 p.
INSTITUTO NACIONAL DE CÂNCER (Brasil). Controle do câncer: uma proposta de integração ensino-serviço. 3. ed. rev. Rio de Janeiro: INCA, 1999. 304p.
INSTITUTO NACIONAL DE CÂNCER. Estimativa 2010: incidência de câncer no Brasil. Rio de Janeiro: INCA, 2009. 98p. Disponível em: < http://www1.inca.gov.br/estimativa/2010/ >. Acesso em: 8 nov. 2009.
KAKKAR, A. K. et al. Venous thrombosis in cancer patients: insights from the frontline survey. Oncologist, Ohio, v. 8, no 4, p. 381-388, 2003.
LEE, A. Y. Y. Epidemiology and management of venous thromboembolism in patients with cancer. Thrombosis Research, New York, v. 110, no. 4, p. 167-172, june. 2003.  
PRADONI, Paolo. Venous thromboembolism risk and management in women with cancer and thrombophilia. Gender Medicine, New Jersey, v. 2, suppl A, p. 528-534, 2005.
SCHABEL,  F. M. JR. Concepts for systematic treatment of micrometastases. Cancer, New York, v. 35, no.1, p. 15-24, jan. 1975.
VENEGAS, L. F.; FLECK, J. A biologia das metástases. In: Fleck, J. Câncer: integração clínicobiológica. Rio de Janeiro: Ed. Medsi, 1992. p. 55
http://www.inca.gov.br

Nenhum comentário:

Postar um comentário

O Site da Fisioterapia em Manaus